domingo, 14 de novembro de 2010

Capítulo II

Fiquei ansioso na manha do dia seguinte que havia deixado a carta em sua casa. Perguntava-me se ela teria lido, teria simplesmente ignorado, ou não a teria visto. Meus pensamentos voavam durante a aula de ciências, e a única coisa em que eu conseguia pensar era o que ela estaria pensando ao ler a carta que escrevi. Minha inquietude superou meu senso de realidade, e, então, mais uma vez me vi dirigindo-me a casa branca de vigas altas. Dirigi-me diretamente para o muro. Não sabia se ficaria mais apreensivo se não encontrasse mais a carta, ou se a encontrasse no mesmo lugar em que eu havia deixado. Apressei-me discretamente para não parecer suspeito aos outros pedestres da rua e dirigi-me ao pequeno muro. Fiquei imóvel, a carta não estava mais ali. Então milhões de perguntas começaram a surgir em minha cabeça e fui lentamente me afastando da casa em um misto de terror e esperança. O que teria ela pensado ao ler minha carta? Será que ela gostaria de me conhecer? Será quer ela realmente leu a carta, ou alguém a pegou e simplesmente a descartou? Ou pior, a leu?
Agora eu não mais caminhava pela rua, mas sim corria, fugindo de um inimigo invisível que podia muito bem estragar meus planos amorosos. Cheguei a casa e Oliver estava só na sala de jantar, relia o mesmo livro velho e vermelho que eu conhecia desde a infância, porém, desta vez, lia-o escondido, pois minha mãe o proibira. Não ousei em fazer nenhuma feição que exprimisse alguma repressão de minha parte, pois eu também estava fazia o que mamãe disse para eu não fazer: mais uma vez eu chegava atrasado para o jantar. Fiquei esperando o olhar repressivo de minha mãe ou até de meu pai, mas ele não veio. Oliver estava só em casa – o que achei extremamente estranho-. Segundo Oliver, meus pais haviam viajado a negócios, algo que havia se tornado cada vez mais freqüente por alguma razão que eu desconhecia. Não havia nenhum empregado em casa, eles haviam simplesmente desaparecido junto com meus pais. Meu irmão percebeu os pensamentos que decorriam em minha cabeça e preocupou-se. Tentou acalmar-me e disse que todos estariam de volta pela manhã, porém eu sabia que algo ali estava errado. Sentei-me na poltrona e descansei minha cabeça em seu encosto, ainda pensando na carta e seus possíveis destinos. Levantei-me então para ligar a televisão. Oliver levantou e parou na frente do objeto. Ele proibiu que eu a ligasse. Emburrei-me e perguntei o porquê de tal proibição, ele então gaguejou e simplesmente disse que haviam sido ordens da mamãe. Nunca havia visto meu irmão tão apavorado, aparentemente ele tentava me proteger de algo que provavelmente estaria na televisão. Olhei para ele curioso e ainda um tanto bravo, ele não se mexeu.
- Desculpe Tom, mas a mamãe pediu que não você não assistisse à televisão, e nós devemos respeitá-la.
- Tudo bem, mas então você também deve parar de ler esse seu livro velho, pois eu ouvi mamãe proibindo você de lê-lo.
- Ora, nós não estamos em nenhum tipo de negociação aqui irmãozinho, eu disse sem televisão, você fica sem televisão. Você já tem sorte de eu não questionar por que você anda chegando atrasado para o jantar. Sem televisão é sem televisão, e ponto.
Enfureci-me. Oliver estava tentando ser uma mescla de meu pai e de minha mãe que o tornava insuportável. Deite-me um pouco em minha cama e voltei minha atenção a dar murros no travesseiro. Aparentemente meu irmão ouviu meus grunhidos incessantes de raiva e bateu em minha porta, não perguntou como eu estava apenas disse que o jantar estava pronto. Nunca havia visto Oliver cozinhar, ou melhor, nunca havia visto um menino cozinhar, Stephan me ensinara que tal dote servia apenas para mulheres, e começava eu, então, a desconfiar que algo muito grave acontecia em minha família. A comida de Oliver não estava muito boa, mas não ousei questionar, pois percebi que se sentia triste, ou até humilhado de ter que se submeter ao que, se outras pessoas soubessem, seria motivo de escárnio. Ele estava preocupado, aparentemente não apenas comigo ou com a comida, mas com algo muito mais grave que eu sabia que não deveria perguntar. Após reorganizar a louça e a mesa, fui me deitar. Coloquei meu pijama azul e sentei-me na cama. O quarto de Oliver era ao lado do meu. Ouvi então que ele subia as escadas e então fechara a porta. O som deste movimento foi abafado por gritos quase mudos que meu irmão soltava. Não sabia se ele chorava, mas algo na voz de Oliver soava como pura angústia e dúvida. Percebi então que não pensava mais na carta ou na menina loura, mas sim no fato de que algo profundo acontecia, e eu era o único que não sabia de nada.

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